segunda-feira, 6 de agosto de 2012

José de Arimatéia


 Figuras da Paixão

José de Arimateia

a.j. chiavegato


  • Jerusalém situa-se em planalto nas Montanhas Judeias, entre mares Mediterrâneo e Morto, altitude de 760 m, destacando-se os Monte das Oliveiras e o Monte Scopus. O clima é mediterrâneo, em dias de verão, seco, no inverno, frio, raramente cai neve. Em Nisã, (abril), inícios da primavera, ainda amendoeiras não floresciam, no meio em o verde-escuro dos pinheiros e oliveiras. À tardinha, José de Arimateia foi procurar Pilatos pedindo o corpo de Jesus que se admirou morrido tão depressa. Chamou o centurião, confirmada sua morte, mandou dar-lhe o corpo. Depois de ter comprado um pano de linho, José tirou-o da cruz, envolveu-o no pano com os aromas e depositou-o num sepulcro escavado na rocha, em que ninguém ainda fora depositado rolando uma pedra para fechar a entrada e foi-se embora, antes que a noite chegasse.


Corta.

  • Todas as estradas levam a Roma quando era o símbolo do poder, era o umbigo do mundo. Nunca vi uma estrada triste, gosto-as especialmente à sombra, fim de tardes, noite e madrugada, hora de gente nascer e morrer, antes que nasça a manhã. A estrada leva a tudo que a gente quer, a uma igreja, a uma casa, chaminé de fumaça branca acenando calor, cheiro de viver e amar. Hoje defino que todas as estradas levam a Jerusalém

  • Inventaram-se muros a fechar cidades, simultaneamente construíram ao menos uma porta que se fecha e abra, estradas que chegam e partem em rumos de horizontes. Em tempos de Neemias, Jerusalém tinha um monte de portas, doze. Hoje, oito, com outros nomes. Em tempos de Jesus, não pesquisei número e nomes de portas que no fundo não nos interessa. O evangelista cita a Porta das Ovelhas (João 5,2), seguramente tinha a Porta dos Peixes que me interessa nesta crônica. Era uma portona de madeira de cedro de Líbano de fora e dentro talhados em aramaico que traduzo: PUSCH / PULL Junto a ela, fica o mercado de peixe, a maior confusão e cheiro que vou te dizer! Peixeiros traziam mercadorias do Mar Galiléia, ou Lago de Genesaré, ou do Rio Jordão, deste peixes miúdos, lambaris pescados a vara por amadores aos fins das tardes, tomando pinga e fumando a espantar pernilongos. A categoria dos peixeiros era a mais forte, em número de membros. Sindicato não tinha, romanos não permitiam desde o tempo da ocupação no 63 A.C. , reuniam-se junto à porta e a um barzinho não longe, pouco mais a uma pedrada de bodoque, tomando umas pingas e comendo iscas de peixes. Quando morava em Nazaré, Jesus nunca fora visto por . Depois, em vida pública, vira e mexe pintava por . Aliás, escolheu entre pescadores, apóstolos e discípulos

  • Uma noite, José Arimatéia acompanhou Nicodemos a encontrar Jesus, aos escuros que se pelava de medo dos judeus. Esse bar era frequentado por pescadores, pobres, ricos e ate umas prostitutas, entre elas, uma tal de Maria, uma coisa, que mulher! Longos cabelos e olhos negros a derrubar fortes santos, mas incautos e velhos indo a fogo morto. Dizem que viera de Magda, divergem autores, não importa, coincidiam em beleza e de nos demais. Fariseus não iam, de jeito nenhum, quando queriam mulher, iam chamar num sombrio tipo motel na estrada de Samaria. E maldiziam de Jesus: esse anda com beberrões e prostitutas, cruz! – e cuspiam de lado. José vinha de Arimathaim, onde provavelmente nasceu o profeta Samuel, quando se registra Ramataim, posteriormente mudou de Rentis, para ver se progredisse, mas num teve jeito, séculos passaram e ventos levaram, evaporou-se. Hoje, consta Lida ou Lod, onde se localiza o internacional aeroporto de Israel Ben Gurion. José possuía um pequeno latifúndio, velho jeito de judeus de esconder propriedades a escapar de impostos, embora era honesto. Apenas disso, nunca se deu bem com Mateus, quando se chamava Levi o coletor, que fazia a praça de Cafarnaum. A diferença entre eles não era o problema de impostos, mas por causa de Herodes. Este era chefe de Mateus. José Arimatéia não suportava Herodes, por razões políticas, amigo de Pilatos. Mas, voltemos ao pequeno latifundiário. Gente, o cara tinha terras, léguas e léguas até onde nasce o rio Jordão, para chegar ao fim das terras, passava por dezessete porteiras! O forte dele era a produção de azeitonas das graúdas, exportava cheios de containers do armador Jonas, naturalizado grego nascido de Gate-Hefer, junto a Nazaré. A Naves Jonas tinha sede em Nínive, hoje, Mozul, ponto estratégico comercial entre Mediterrâneo e o Índico. A companhia se ostentava a tradição desde 750 A.C. quando a fundara Jonas. José vinha de família humilde, gostava de dizer aos clientes gregos: me fiz de si mesmoarranhando o grego a que o correto era: self-made man. Antes que me esqueça, dizem que era irmão de Joaquim, pai de Maria, avô tio de Jesus, é mole?! Voltemos ao currículo moral: corretíssimo. Certa vez perdeu um negócio de grande partida de trigo para fornecer o exército romano sediado nas Gálias, conduzido por Cesar (cf. o De bello gallico). Pedágio não pagava, uns diziam que era um trouxa. Jesus olhava dentro, os profundos das pessoas, despia-os de velhas roupas a resplandecer um coração pobre, sem orgulho e ostentação apesar poderoso político membro do Sinédrio. Disseram que foi senador pela Judeia em Roma, outros, decurião, espécie de ministro das exportações de chumbo e estanho. Não sei, estamos caindo em lendas, entre incensos de desvarios, quem sabe, verdades escondidas

  • A igreja venera José Arimatéia no dia 31 de agosto, padroeiro dos coveiros e embalsamadores. Cansado o retrataram em fins de vida, todos os bens entregues aos pobres, sem um menor traço de um coração de rico, nada guardando para si, nem o sudário, nem o Santo Graal, lembranças do rosto indelével no lençol de Jesus, cálice de vinho e sangue. Santo José Arimateia, colhendo em seus braços Jesus morto e o deixou em seu sepulcro e em nossos corações. A semente

sábado, 14 de julho de 2012

Bispos também morrem


                                                                                                                                         CRÔNICAS DO REINO
Bispos morrem


a.j.chiavegato


Ao entrarem bispos em catedrais, órgão e coro irrompem: Tu es sacerdos in aeternum! que traduzo a meu jeito: bispo não morre nunca! 

Aos cinco anos, nem sabia o que era bispo, muito menos cabia em minha cabeça a ideia de morte , meu negócio era comer, brincar, dormir, . Meu pai me chamou depois do almoço: sua mãe vai vestir você que vai comigo no enterro do bispo que morreu. Sem nada dizer, em mãos de meu pai, fui

Em frente do Bar Ideal, rua Barão de Jaguara, Largo do Rosário, plantamos. Gente pra burro e mais gente que chegava, eu em mão de meu pai que não me perdesse, guardas com cordas amarrando o povo para ninguém entrar no meio da rua, todo mundo olhando sei no quê, quase não falavam, cochichando, ninguém ria. começou passar um monte de padres que nem o de Jaguary, de vestido de preto, de vermelho, de roxo, até meninos de saia de preto, uns velhos carecas com capinhas vermelhas carregando tochas com vidro que nem lampião, freiras de azul, negros com capinhas pretas, um trazendo um treco com o retrato de São Benedito, mulheres de fitas e véus, fitas vermelhas, amarelas, moças de branco, fitas de azul e uma faixa na barriga, gentes, muita gente, rezando, procissão não era, achava, nem santo passou balançando com pescoço duro

Meu pai disse: vai o bispo, tirando o chapéu. Onde? – vi bispo nenhum. Meia dúzia de padres carregavam uma caixona de madeira que nem uma canastra que tem em casa cheia de roupas velhas e trapos, essa era a mais comprida e de madeira venisada, atrás, a banda. Tocava diferente, nem tocava taratachin como dia de festa e rojões, sinos não tocavam. Entendi: aquilo era morte de bispo, não gostei e o pouco que me restou, uma tarde cinza de agosto, imagens quase apagadas, esfumaçadas em nuvens de incenso: Dom Barreto.

pelos seis anos, nítidas caiam as imagens em cabeça, começava minha história e lia

No alto da lousa do Curso Infantil São José, lia: Jaguary, tanto de tanto de 1942. Dona Hermínia, a professora que tinha sido freira, solteira, passados prazos de casar. Um dia, dava aulas para primeira comunhão. Pelas duas horas, o sino da igreja tocou batendo que alguém morreu. Avisaram, dona Hermínia descabelou-se: Nossa Senhora! – disse segurando a cabeça dizendo: não tem mais aula, morreu o bispo de São Paulo, caiu do avião

Em rasos fundos de minha infância, fantasiava-me bispo, vestido de batina preta, faixa e meias roxas, do alto tudo caindo do avião, de ponta de cabeça com tudo e de sapato. Em fila, fomos à igreja rezar pelo bispo: dom José Gaspar. Devagar fui aprendendo que bispo também morria

Hoje, aos meus setenta e seis anos, mais de cem de bispos, conhecidos e colegas de estudo, se indo em procissão nas ruas de minha vida, desfilando solenidades da morte.

Poucos dias, meu amigo Dom Eugênio Salles. Conheci-o em tempos de bispo de Natal e posteriormente em Concílio, admirava-o por ideias e jeito de ser bispo. Estudei com seu meio irmão, Otto. Ao longo de sua vida e de minha, não sei se minhas ideias batiam com as dele, que importa?! Cristalizo-me em sabedorias de velho: não meço mais as pessoas pelas ideias, mas pelo que fizeram e fazem, mesmo que por pequenos gestos em favor dos homens, mais infelizes e perdidos

Dom Eugênio em recente entrevista, contou: voltando a sua casa, de noite tarde, como de costume, passava pela floresta da Barra da Tijuca, sempre via homens armados, área de tráfico, quando passava baixavam suas armas que o conheciam. Por vezes, um morto à beira da estrada, parava, ia ao morto e rezava. Nunca me molestaram - disse. Aos que elogiavam sua coragem, dizia rindo: coragem, coisa nenhuma! rezava, dava benção ao morto, saia de fininho, entrava no carro sem lhes dizer nada que eu não era besta. De tudo o que falou, escreveu e ensinou o evangelho de Jesus, resta-me apenas a figura de um velho bispo junto a um morto caído na beira da estrada na Barra da Tijuca que leva a Jericó (cf. Lc 10,30-37).